Imagine comprar um apartamento por meio de uma transação direta, sem intermediários e toda aquela habitual burocracia. Bem mais fácil, não? Pois essa possibilidade não está tão longe de se concretizar. Até o fim de 2024 ou o início de 2025, os brasileiros deverão ter acesso ao Drex, um “primo do Pix” que vai impulsionar a economia do país ao permitir operações desse porte.
Mas se você se afeiçoou ao Pix, pode ficar tranquilo: o Banco Central já avisou que ele não será extinto. Até porque cada tecnologia tem uma funcionalidade diferente. Enquanto o Pix consiste em um sistema de pagamentos instantâneos, o Drex é uma CBDC, sigla para Central Bank Digital Currency – ou Moeda Digital do Banco Central. O Drex nada mais é do que a versão virtual do Real. Se você dispuser de 100 unidades em sua carteira digital, contará com exatamente R$ 100.
A característica diferencia uma CBDC de criptomoedas como o Bitcoin, que apresentam grande volatilidade, conforme a oferta e a demanda do mercado. E, embora ambos os formatos recorram ao uso de blockchain – uma tecnologia descentralizada, criptografada e praticamente impossível de hackear –, no caso das moedas digitais privadas, qualquer pessoa pode participar da rede e validar as transações, já que elas têm código aberto.
O sistema adotado pelo Banco Central do Brasil será fechado, pois conterá informações sensíveis e sigilosas. Além disso, permitirá a criação de contratos inteligentes autoexecutáveis, os smart contracts, que deverão agilizar processos como a venda de imóveis e veículos.
“Se você pensar em uma transferência bancária simples, o Pix já supre essa necessidade. A questão é que a tecnologia em blockchain abre um portal para outras transações mais complexas, que chamamos tecnicamente de DvP [Delivery vs. Payment, ou entrega contra pagamento, em tradução livre]. Você reserva um pagamento, mas ele só se concretiza quando o serviço da contraparte estiver feito”, afirma Carolina Sansão, diretora-adjunta de Inovação, Tecnologia e Cibersegurança da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
Na prática, o procedimento diminui o risco de fraudes ou de quebra de contrato. O especialista no setor financeiro Rogerio Melfi, membro do comitê de Open Finance da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), destaca que os smart contracts proporcionam eficiência, transparência e segurança nas operações.
“Pense, por exemplo, em um agricultor que vende sua produção para uma grande distribuidora. Ao usar o Drex, ele pode ter a certeza de que receberá o pagamento assim que a distribuidora receber a entrega, graças aos contratos inteligentes que garantem que ambas as partes cumpram suas obrigações”, explica. Entre outras funcionalidades, os smart contracts possibilitam a criação e o comércio de tokens não fungíveis (NFTs), assegurando a autenticidade, a propriedade e a transferência desses ativos digitais na rede blockchain. Em transações imobiliárias, ajudam a verificar a identidade das partes, validar documentos e transferir títulos de forma automática e segura.
Fase de testes do Drex
Embora pareça um termo em inglês, o nome Drex é uma combinação de letras que remetem às características da moeda digital brasileira: D de digital, referente ao formato; R de real, a moeda brasileira; E de eletrônico, o sistema utilizado; e X que representa a inovação – e faz uma conexão com o Pix.
Embora os primeiros testes feitos com o Drex tenham ocorrido em 2017 e 2018, foi somente em 2020 que o Banco Central decidiu se aprofundar nos estudos sobre a possibilidade de emitir uma moeda digital brasileira. Em agosto de 2022, começou a implementação do projeto-piloto, com a seleção de 16 propostas selecionadas de instituições financeiras, entre candidaturas individuais e consórcios de entidades.
O objetivo é concluir essa etapa – na qual serão observados aspectos como a funcionalidade e a privacidade das informações – até maio de 2024. Para tanto, é preciso oferecer segurança jurídica na Plataforma Drex, um ambiente em desenvolvimento que usa tecnologia de registro distribuído (em inglês, Distributed Ledger Technology, ou DLT), com respeito ao sigilo bancário, à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) e a normas internacionais sobre prevenção à lavagem de dinheiro.
Depois disso, o Banco Central decidirá pela ampliação ou não da fase de piloto, incorporando outros modelos de negócio, até o lançamento da plataforma para a população. Como já ocorre com o Pix, o acesso aos serviços ocorrerá por meio de aplicativo bancário, em uma operação simplificada.
“A incorporação de tecnologia não é um fim em si, então é importante apresentá-la de uma forma que a população brasileira possa fazer uso em seu cotidiano”, defende o economista Fabio Araujo, coordenador do projeto do Drex no Banco Central. “Se essa tecnologia for incorporada de maneira adequada ao ambiente regulado, as possibilidades de aprofundamento da inclusão financeira são muito grandes.”
Custos x benefícios
Ao contrário do Pix, o Drex terá um custo para o consumidor. Ainda não se sabe quanto, pois o valor da taxa dependerá de cada instituição financeira que adotar o sistema. A expectativa do Banco Central é de que ela seja inferior à cobrada em serviços tradicionais, graças à economia gerada pelos contratos inteligentes.
Mesmo que o cenário ainda esteja pouco definido, uma coisa é certa: o Drex veio para ficar. Assim como o Pix, que caiu nas graças de 153 milhões de brasileiros, a moeda digital representa um novo passo rumo ao sistema financeiro do futuro, em que o papel-moeda será objeto de colecionador.
Araujo considera cedo para fazer projeções, mas acredita que o impacto da iniciativa sobre os negócios de pequenas e médias empresas – e para a população em geral – deve ser bastante positivo. “Uma vez que a Plataforma Drex possibilitará a redução de custos operacionais e o uso mais eficiente e seguro de garantias de operações financeiras, o custo final do crédito ao consumidor e de linhas de capital de giro ou de médio prazo tende a ser significativamente reduzido”, projeta. //
4 vantagens do Drex
A implementação do Drex representará um novo marco no setor financeiro brasileiro. Segundo Rogerio Melfi, do comitê de Open Finance da ABFintechs, a moeda digital poderá proporcionar diversas vantagens, além da já mencionada confiabilidade nas transações.
- Novos negócios – A possibilidade de tokenização de ativos pode abrir caminho para novos modelos de negócios. “Imagine uma galeria de arte que tokeniza uma obra valiosa, permitindo que várias pessoas comprem ‘partes’ dessa obra como investimento. O Drex facilitaria tais transações, tornando-as transparentes e seguras”, aponta Melfi.
- Democratização de ativos e investimentos – Como ativo digital, o Drex tem um potencial significativo para melhorar a inclusão financeira de várias maneiras. “Um brasileiro de classe média que não tem capital suficiente para comprar um imóvel inteiro pode optar por investir em tokens representativos de uma parte desse imóvel. Isso abre um novo mundo de oportunidades de investimento.”
- Uso facilitado – “A natureza digital do Drex permite que as transações sejam feitas usando dispositivos móveis, beneficiando, por exemplo, moradores de áreas rurais que têm acesso limitado a infraestruturas físicas do sistema financeiro, mas possuem um smartphone”, avalia o representante da ABFintechs.
- Redução dos custos de transação – A eficiência e a velocidade do DLT – a tecnologia de registro distribuído – podem resultar em custos de transação menores. “Para quem faz várias transações por dia, a economia significa mais resultado no final do mês.”